A experiência de transição agroecológica a partir de sistemas agroflorestais da Comunidade Serragem, município de Nossa Senhora do Livramento - MT
Keywords:
manejo, camponeses, agroecossistemasAbstract
A experiência de transição agroecológica a partir de Sistemas Agroflorestais da Comunidade Serragem, município de Nossa Senhora do Livramento - MT
The experience of agroecological transition from Agroforestry Systems of the Serragem Community, municipality of Nossa Senhora do Livramento - MT
LARANJA, Rafael Leite Brandão¹; Maria Valéria2; OLIVEIRA, Fábio Augusto Bardusco1; SILVA, Wendel Carvalho Joaquim¹; NOBRE, Henderson Gonçalves¹, DAMACENO, Gessyka; LEMES, Andressa.
1 UFMT, neagroufmt@gmail.com; 2 Comunidade Serragem, (65)993078177.
Eixo temático: Manejo de agroecossistemas
Resumo
O objetivo deste trabalho é apresentar a experiência da Comunidade Serragem no município de Nossa Senhora do Livramento, território da Baixada Cuiabana em Mato Grosso. Objetivando resguardar suas práticas tradicionais e evitar a utilização de agrotóxicos e insumos sintéticos a comunidade iniciou um processo de transição agroecológica utilizando Sistemas Agroflorestais. Utilizando ferramentas participativas na construção de espaços de construção do conhecimento foi realizado uma diversidade de atividades que culminou na implantação de uma unidade de referência em sistemas agroflorestais da comunidade. Como resultado deste processo, a unidade de referência conseguiu incorporar as variedades já produzidas na comunidade, bem como diversificar e perenizar a produção com a inserção de espécies arbóreas. Porém, em um curto espaço de tempo o principal resultado foi o estímulo e fortalecimento da organização coletiva e despertar de interesse dos agricultores e agricultoras mais jovens da comunidade.
Palavras-Chave: manejo, camponeses, agroecossistemas.
Keywords: management, peasants, agroecosystems.
Contexto
O estado de Mato Grosso localiza-se na região Centro-Oeste do Brasil, abrigando os biomas Cerrado, Pantanal e Amazônia. Esses diferentes macroecossistemas estão intimamente relacionados ao modo de vida das populações tradicionais que habitam esses territórios. Indígenas, quilombolas, vaqueiros, raizeiros, ribeirinhos e agricultores tradicionais possuem suas identidades associadas ao Cerrado.
O Território da Baixada Cuiabana é composto por pequenos municípios ao entorno de Cuiabá e Várzea Grande, que se destacam como polos econômicos urbanos. Ao se excluir os municípios de Cuiabá e Várzea Grande, o Território apresenta um Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de 0,697 (menor do que a média do Estado de Mato Grosso e do Brasil), com 40% dos domicílios em situação de pobreza, sendo que quantidade significativa destes se encontram na zona rural. (GARBIN et al., 2006)
A Comunidade Serragem localizada no município de Nossa Senhora de Livramento, distante 100 quilômetros da capital é um povoado com um total de 20 famílias (EMPAER, 2015). Considerados povos tradicionais, são grupos culturalmente diferenciados que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição (BRASIL, 2007).
Os subsistemas de produção da Comunidade Serragem, assim em quase todo território da Baixada Cuiabana podem ser caracterizados através de algumas atividades principais, como a produção de mandioca, hortaliças, gado de leite e outros subsistemas secundários como a banana, abacaxi, e outras frutas (GARBIN et al., 2006). Atualmente as famílias da comunidade Serragem tem investido na produção de legumes e verduras (caixarias) para comercialização no Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Porém enfrentam limitações para alcançar uma produção mais equilibrada e com menor dependência de insumos externos.
Desta forma, os Sistemas Agroflorestais (SAF’s) consistem em uma estratégia importante para potencializar esta produção e desenhar um agroecossistema mais equilibrado com maior aproveitamento dos recursos locais, otimizando mão-de-obra, área e recursos financeiros e humanos agregando benefícios econômicos, sociais e ambientais.
O processo de diálogo e construção com as famílias da comunidade Serragem se deu no programa “Rede de Cooperação Solidária do Mato Grosso (RECOOPSOL)” e projeto “Transição agroecológica a partir de sistemas agroflorestais no território da Baixada Cuiabana”, ambos coordenados pela Universidade Federal de Mato Grosso. Mesmo em um estágio inicial estes promoveram a sensibilização e capacitação de agricultores, técnicos e estudantes entre os meses de janeiro e junho do ano de 2019 para desenvolver e socializar técnicas de manejo não convencionais, através de cursos, dias de campo, intercâmbios de experiências e mutirões junto às famílias da comunidade Serragem.
Descrição da Experiência
A interação com a comunidade Serragem se deu dentro do programa RECOOPSOL em função da participação e protagonismo dos representantes de sua associação no Fórum Territorial de Segurança Alimentar e Nutricional (FTSAN), onde a mesma demonstrou interesse em participar do projeto de transição agroecológica para conservar seus modos de vida e de manejo de seus agroecossistemas. Mesmo sendo uma comunidade tradicional da Baixada Cuiabana, os agricultores mais jovens enfrentavam limitações na expansão de suas áreas produtivas e para tal se viam “forçados” a adquirir insumos externos (herbicidas e adubação sintética) para maximizar sua mão-de-obra.
Em reunião junto ao grupo de famílias foi apresentado teoricamente um conjunto de ferramentas agroecológicas para que os mesmos pudessem obter maior independência de seus sistemas produtivos (Figura I). Mas visando dar um maior respaldo à discussão teórica, representantes da comunidade participaram de um intercâmbio agroecológico agroflorestal e ao retornarem deram início a uma discussão interna para implantarem uma unidade de referência (UR) em sistema agroflorestal na comunidade.
Posteriormente, representantes das comunidades participaram de um curso prático em desenho e planejamento de sistemas agroflorestais com o intuito de iniciar o desenho dessa UR, atendendo os objetivos de renda, segurança alimentar das famílias e diversidade ecológica (Figura II). Adicionalmente, foi realizada amostragem de solo da área onde seria implantada a UR para uma análise mais profunda da fertilidade natural do solo, onde se verificou a necessidade de complementação de Fósforo que foi realizada no preparo da área com uma fonte de fosfato natural reativo disponível da região.
Figura I: Reunião de apresentação do projeto na comunidade Serragem.
Figura II: Agricultoras participantes do Curso de desenho e Planejamento de SAF’s.
Em sistema de mutirão foi implantada em maio/2019 a UR de SAF’s na comunidade Serragem, com aproximadamente 2.025 m², conforme esquema abaixo (Figura III). Na composição das espécies do SAF’s foi priorizado incorporar as variedades de legumes e verduras que as famílias já utilizavam em seus sistemas de plantio, como exemplo jiló, quiabo, maxixe, pimentão, abóbora, dentre outras. Porém, foi adotado espécies arbóreas madeiráveis, frutíferas e para biomassa, de modo a perenizar a produção, incrementar biodiversidade ao agroecossistema e diversificar a renda.
Adicionalmente, a utilização de adubação verde foi inserida de modo a incorporar nutrientes no solo, bem como auxiliar no controle das plantas espontâneas e assim evitar a utilização de herbicidas e adubação sintética. Em função da produção constante de legumes e verduras até que as espécies arbóreas iniciem a produção, bem como a realização do plantio ter sido realizada no final do período de chuvas, foi instalado um sistema de irrigação com mangueiras micro perfurada a laser que produz microjatos de água direcionados para cima, irrigando 100% da área.
Destarte que no processo de construção de conhecimento da comunidade Serragem, podemos destacar a participação efetiva da direção da associação de agricultores, o protagonismo das mulheres do grupo, a participação de agricultores de comunidades vizinhas, bem como o grande interesse dos agricultores e agricultoras mais jovens que recém retornaram para a comunidade e vislumbram nos SAF’s uma estratégia mais condizente com seus objetivos.
Figura III: Desenho do SAF’s
Resultados
Em um curto espaço de tempo podemos verificar indicadores importantes de avanço no processo de conservação do conhecimento tradicional e construção do conhecimento agroecológico na comunidade Serragem, e seguramente isso se deve ao protagonismo dos representantes da associação da comunidade.
Os Sistemas Agroflorestais apresentaram um grande potencial de incorporar os cultivos já desenvolvidos pelas famílias, bem como incorporar uma maior diversidade, estabilidade e resiliência aos agroecossistemas da comunidade.
Outro resultado de extrema importância foi o interesse e participação de agricultores e agricultoras mais jovens da comunidade, que vislumbram um sistema de produção mais dinâmico e moderno que otimize a mão-de-obra e proporcione maior qualidade do trabalho no campo.
Agradecimentos
A todos os agricultores e agricultoras da comunidade Serragem e sua associação, aos vários parceiros deste trabalho e ao Departamento de Economia solidária do Ministério da Cidadania que financiou as ações.
Referências bibliográficas
BRASIL. Decreto 6040, de 7 de fevereiro de 2007 - Política de desenvolvimento sustentável dos povos e comunidades tradicionais. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6040.html> Acesso em: 05 jun.2019.
Empresa Matogrossense de Pesquisa, Assistência e Extensão Rural (EMPAER). Agricultura familiar em números: 1ª aproximação. Compilado por Antônio Rocha Vital. Cuiabá, 2015. 89p
GARBIN, V.H.; SILVA, M.J.; OLIVAL, A. Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável Território Baixada Cuiabana – MT. Fundação Cândido Rondon. 2006.